"São 3 horas da manhã, você me chama pra falar coisas que só a gente entende. E com seu papo poesia me transcende..."

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Santo Antônio

Casal voltando pra casa e o homem puxa assunto:
- Amanhã, a gente tem que pegar o pão de Santo Antônio, hein?
- Ah, vc acha?
- Olha, antes da gente casar a gente foi lá e pegou o pão, não lembra?
- Eu estrangulei o santo isso sim! Enquanto a gente não casasse, eu não iria aliviar a parte dele.
- Então! Juntamos o pão com farinha ainda! E cá estamos nós, juntos!
- É verdade! Ok, a gente pega o pão, mas dessa vez eu não vou estrangular ele.
- Tudo bem, acho que ele não vai ligar em não ser estrangulado dessa vez...

No caminho para casa, eles ainda passam pela porta de uma igreja. No chão, tinha um Santo Antônio sem cabeça. Uma outra terrorista romântica parece ter passado por ali. Santo sofre...

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Pontos de distração

Eu tinha que esperar uma pessoa e, por incrível que pareça, neste dia eu estava adiantada. Tudo bem que eu estava acompanhada da minha madrinha, o que pode ter contribuído para eu chegar antes da hora. Detalhe... O que importa mesmo é que eu não tinha nada para fazer a não ser sentar no banco da Uruguaiana e esperar. Para quem não conhece o Rio de Janeiro, eu estou falando de uma das ruas mais movimentadas do centro da cidade. E bota movimentada nisso! Ok, o centro costuma ser assim, mas eu acredito que a Uruguaiana se supera. Ou melhor, as pessoas se superam...

Foi à conclusão que eu cheguei logo assim que uma mulher, com um cartaz sobre gravatas em seu corpo se aproximou dela e disparou: “Toma esse papel pra você aprender a dar nó de gravata! É, eu sei... Eu não devia abordar as pessoas, mas você estava olhando tanto pra lá que eu resolvi vir aqui. Eu senti que você quer aprender sobre gravatas! Olha, aqui tem todas as instruções! Depois você passa lá na loja pra comprar uma e treinar!”. E na empolgação até eu ganhei o papel com os nós passo a passo. Hã! Gravata??

Em seguida, dei de cara com uma criança em cima da minha perna. Ela era tão pequenininha que poderia passar debaixo das minhas pernas despercebida. “Pois bem”, pensei comigo, “ela vai pedir dinheiro para a mãe que está em algum lugar perto daqui”. E já estava me revoltando com essa situação quando ela tirou a mão de trás das costas: “Toma!”. “Hein? O que é isso?”. “Um papel pra você”. Na folha: “Cristina Paz – jogo búzios, tarô e runas. Resolvo os seus problemas”. Ah, sim, Cristina Paz devia ser a mãe dela. “Ah, você quer me dar o papel”. Ela então sorri e sai de perto. Quando observo, vejo que ela sai pegando mais papéis daquele pelo chão. Ah tá, agora sim, foi apenas um lixo de presente... E o dia prossegue.

Policias passam, morrendo de rir. Estão tranqüilos e parecem passear, não trabalhar. Cada um deles com pedaços de plástico bem finos e azuis dentro dos bolsos das calças. Algemas de plástico? Na verdade, parecia mais aquelas pulseirinhas VIPs de festas, sabe?

Uma mulher com uma bolsa enorme em formato de peixe colorido sobe a rua. Está com pressa e o peixe coitado, balança como se estivesse em um mar revolto.

Um cara abre sua barraquinha do Santo Expedito. Na frente, um cartaz gigantesco com a foto dele com cara de sério e a imagem do santo. Do lado de fora, a própria imagem. Maior do que eu.
Ali, vende orações, livrinhos e a mensagem do Santo. Seria pagamento de promessa? Eu hein, foi-se o tempo em que as pessoas apenas subiam as escadas de uma igreja...

Um rapaz passa e entrega um papel: “Cristina Paz – jogo búzios, tarô e runas. Resolvo os seus problemas”. Ai, ai, ai, tem gente querendo resolver MESMO os meus problemas. Até que seria interessante, né? Você paga uma pessoa e a vida fica bela! Será que ela tem os números da Sena? Comecei a pensar melhor sobre o assunto...

Um homem com o cartaz no corpo “Vendo Ouro” desce a rua conversando com o amigo que anda com o cartaz “Desbloqueio celulares”. Estavam falando sobre uma garota bonita que conheceram no bar, na noite passada.

Os policiais voltam. No maior papo-furado e cheio de sacolas! Comida, bebida... Eu ainda acho que eles estão indo para alguma festa... Vai ver, nem são policiais e estão indo para uma festa à fantasia. Ei! Mas ainda nem era meio-dia!

Um “Sombra” passa atrás de duas meninas, que nem deram conta de que estavam sendo seguidas. E melhor: imitadas! Sombra, aquele tipo de artista que pinta a cara de branco e sai repetindo os gestos das pessoas, conhece?

Uma mulher passa e me entrega um papel: “Cristina Paz – jogo búzios, tarô e runas. Resolvo os seus problemas”. Caraca! Será que era a própria? Vou te dizer, a dona tá comandando a região...

Um homem vendendo bichos de pelúcias muito, mas muito grandes, passa. Um urso com o olho meio torto e um cachorro coma língua de fora. Pareciam estar cansados. Já o homem estava animadão andando pra cima e pra baixo, segurando os animais. Isso vende? Por um segundo eu resisto à tentação de fazer essa pergunta.

Índios tocam flautas. Até aí normal. O pulo do gato, ou quer dizer, do pajé, é que eles estavam vestidos com adereços de carnaval da Sapucaí! De esplendor e tudo!!Genial.

Era tanta gente ganhando dinheiro de uma maneira inesperada que eu resolvi escrever. Não que eu fosse escrever cartas em troca de moedas, como a Fernanda Montenegro em A Central do Brasil. Não, não... Era só um recurso para eu não esquecer daquelas pessoas. Então abaixei a cabeça e me concentrei na folha. Nisso, a minha madrinha começou: “Vamos dar um volta?”. “Já vou”. Estava muito entretida para parar. “Vaneeeessa...”. “Já vou!”. Passa dois minutos: “Vaneeeessa, vamos sair daqui, hein? Hein?”. Nisso, eu comecei a sentir um tom meio apreensivo dela, que agora falava muito baixo. Estranho... Resolvi então levantar a cabeça pra ver o que ela queria. Tchanam!!! Ao meu redor muita gente!! A maioria homens!! “Ow! De onde surgiu esse povo?”. E ao olhar em volta, vejo um homem com um quadro no meio da rua. Escrevia números, tinha uma viseira e usava um microfone. Falava algo como raiz quadrada, soma aqui, tira esse resultado... Sério... O cara estava dando aula de matemática!!! Com direto a responder pergunta e tudo! Incrível. Por alguns minutos até me interessei em descobrir o valor de X de uma questão. No entanto, o fato de estar no meio da roda me fez seguir os conselhos da minha madrinha e sair dali.

Foi quando encontro a pessoa que estávamos esperando. “Vanessa, aonde você estava! Já tinha rodado isso tudo atrás de vocês!”. É... Era uma longa história... Resolvi deixar pra contar depois. Melhor...

E os dias se passaram. Até que um dia, minha madrinha acha na bolsa o papel da Dona Cristina e faz a seguinte observação: “Viu onde era a rua onde ela ficava?”. “Não”. “Adivinha! Rua Visconde do Rio Branco”. "Putz! Tá de zoação?", foi a única coisa que eu consegui responder. Afinal, é o nome da cidade de Minas Gerais onde eu nasci! Meu Deus! Cristina Paz, Visconde do Rio Branco, todos os papéis parando na minha mão... E foi aí que eu percebi tudo... Estava ali na minha cara o tempo todo... Era um sinal! Eu sabia... E se bobear, todas as pessoas da Uruguaiana sabiam! Eu deveria ter ido na Cristina Paz... Ô distração...

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Ps: Esse texto foi uma resposta à crônica de uma amiga: Fernanda Martins. Para quem se interessar em ler: http://poroutrolado.wordpress.com/.